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Para se ter uma idéia, a novela das sete da Globo traz já na abertura o Skank relendo um grande sucesso do Caetano Veloso. E não para por aí. Ainda temos na trilha Ney Matogrosso, Nana Caymmi, Jane Duboc e Paulinho da Viola. Um time de astros de ontem e de hoje. Na trilha das seis está lá o Caetano batendo ponto de novo. E às oito lá está mais uma vez o Caetano, releituras de Chico e Rita Lee, Djavan, Gonzaguinha, Bethânia e por aí vai. Isso só para focar nas novelas em cartaz hoje, e apenas na Globo.
Será que os novos talentos não estão produzindo o suficiente para abastecer esse mercado? Ou será que o público das novelas pede por lembranças de um tempo que já se foi e que deixou saudades? Na minha opinião, nem um nem outro. O mercado fonológico brasileiro é repleto de novidades e talentos. Não acredito que seja certo dizer que os profissionais de hoje não têm o talento dos de ontem. Eles têm sim. Só que o momento e a sociedade os inspiram de outra forma. Talvez nosso presidente da república, por exemplo, não inspirasse hoje nosso Chico Buarque a compor Cálice ou Apesar de Você. Talvez ele inspire apenas a composições como a Dança do Créu. Isso não é uma crítica. Citei o presidente para dar mais peso, mas as influencias vêm de toda a sociedade.
Além disso, acredito sim que nosso Chico Buarque compôs uma obra tão refinada que se tornou atemporal. Em casa, onde somos em três filhos homens, crescemos acostumados a ouvir Chico e seus contemporâneos. Até hoje eles não saem de nossas vitrolas. Digo, de nossos iPods! É gostoso por exemplo, ouvir Águas de Março e se lembrar do Tom Jobim contando que compôs a música em um pedaço de saco de pão, quando tudo estava dando errado na construção de uma casa. Tudo era motivo para a obra atrasar. E um despropósito desses nos trouxe essas águas que devem continuar a rolar por muitas e muitas novelas. Talvez um dia eu pare para fazer um estudo de quantas vezes uma música como essa esteve em trilhas sonoras da TV. No momento prefiro ficar com o doce problema do Tom que se transformou na doce canção abaixo:
Águas de março (Tom Jobim)
É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um caco de vidro, é a vida, é o sol
É a noite, é a morte, é um laço, é o anzol
É peroba no campo, é o nó da madeira
Caingá candeia, é o matita-pereira
É madeira de vento, tombo da ribanceira
É o mistério profundo, é o queira ou não queira
É o vento ventando, é o fim da ladeira
É a viga, é o vão, festa da cumeeira
É a chuva chovendo, é conversa ribeira
Das águas de março, é o fim da canseira
É o pé, é o chão, é a marcha estradeira
Passarinho na mão, pedra de atiradeira
É uma ave no céu, é uma ave no chão
É um regato, é uma fonte, é um pedaço de pão
É o fundo do poço, é o fim do caminho
No rosto um desgosto, é um pouco sozinho
É um estepe, é um prego, é uma conta, é um conto
É um pingo pingando, é uma conta, é um ponto
É um peixe, é um gesto, é uma prata brilhando
É a luz da manha, é o tijolo chegando
É a lenha, é o dia, é o fim da picada
É a garrafa de cana, o estilhaço na estrada
É o projeto da casa, é o corpo na cama
É o carro enguiçado, é a lama, é a lama
É um passo, é uma ponte, é um sapo, é uma rã
É um resto de mato na luz da manhã
São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração
É uma cobra, é um pau, é João, é José
É um espinho na mão, é um corte no pé
São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração
É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um passo, é uma ponte, é um sapo, é uma rã
1 comentários:
Não sei pq (ou melhor, sei) tinha outra expectativa. A idéia é ótima, a discussão é interessante, mas não pude deixar de expressar um: "eh isso?". Hahaha
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